Sinopse: Ao longo dos anos, Jean Taylor deixou de contar muitas coisas sobre o terrível crime que o marido era suspeito de ter cometido. Ela estava muito ocupada sendo a esposa perfeita, permanecendo ao lado do homem com quem casara enquanto convivia com os olhares acusadores e as ameaças anônimas.
No entanto, após um acidente cheio de enigmas, o marido está morto, e Jean não precisa mais representar esse papel. Não há mais motivo para ficar calada. As pessoas querem ouvir o que ela tem a dizer, querem saber como era viver com aquele homem. E ela pode contar para eles que havia alguns segredos. Afinal, segredos são a matéria que contamina (ou preserva) todo casamento.
Narrado das perspectivas de Jean Taylor, a viúva, do detetive Bob Sparkes, chefe da investigação, cuja carreira é posta em xeque pelo caso, e da repórter Kate Waters, a mais habilidosa dos jornalistas que estão atrás da verdade, o romance de Fiona Barton é um tributo aos profissionais que nunca deixam uma história, ou um caso, escapar, mesmo que ela já esteja encerrada. (Skoob)
Livro recebido em parceria com a Editora.
BARTON, Fiona. A viúva. Editora Intrínseca, 2017. 304 p.
Jean Taylor foi casada com Glen por vinte anos e, agora que ele morreu, tem a oportunidade de falar aquilo que sabe sobre o marido: seria ele um marido amoroso acusado injustamente de raptar uma criança, ou ele é realmente o monstro que a imprensa insiste em condenar? Esse é o tema de A viúva, livro de Fiona Barton que se preocupa em mostrar um lado dos tribunais que poucos se preocuparam em abordar: o do companheiro dos acusados e o quanto eles poderiam saber, aqueles que se passam por meros coadjuvantes, mas que acabam sendo arrastados para o centro da história tanto quanto os próprio acusados.
O livro tem uma construção diferente e interessante. Dividido em capítulos curtos que narram os pontos de vista da viúva, da repórter e do detetive, intercala ainda presente e passado, mostrando o conflito atual de Jean agora que Glen morreu, enquanto repassa a sequência de acontecimentos que levaram a polícia a considerá-lo como principal suspeito.
O livro tem uma construção diferente e interessante. Dividido em capítulos curtos que narram os pontos de vista da viúva, da repórter e do detetive, intercala ainda presente e passado, mostrando o conflito atual de Jean agora que Glen morreu, enquanto repassa a sequência de acontecimentos que levaram a polícia a considerá-lo como principal suspeito.
"Eu me sento, para que o quarto pare de girar, e me vejo refletida na janela.
Parece outra pessoa. Alguma mulher que se deixou ser levada por estranhos. Estranhos que até hoje provavelmente estavam esmurrando minha porta e escrevendo mentiras sobre mim. Esfrego o rosto, e o mesmo faz a mulher na janela. Porque ela sou eu.
Olho para mim mesma.
Não consigo acreditar que estou aqui."
O mais interessante da história é a dúvida que paira durante boa parte do texto de Fiona Barton. No começo, é impossível saber se Glen é ou não culpado. Algumas passagens nos incitam a dizer que sim, mas outras reiteram a incerteza sobre algo ter sido deixado de lado, algum indício que poderia levar a outro suspeito. Isso é frustrante e instigante ao mesmo tempo, já que essa dubiedade nos leva a querer saber não só quem, mas como e porquê.
Fiona Barton não nos decepciona quanto a isso. Apesar de sua veia jornalística estar estampada no texto - recheado de trechos descritivos sobre investigação, posicionamento midiático e procedimentos do julgamento -, o que tornou algumas passagens do livro um pouco cansativas, da metade em diante a autora passa a inserir capítulos com pontos de vista de outros personagens além daqueles três iniciais. Isso nos dá uma visão mais ampla de vários acontecimentos e finalmente nos trás algumas respostas.
"Eu não queria mais pensar naquilo. Era difícil demais manter tudo separado na minha cabeça. O meu Glen e aquele outro homem de quem a polícia falava. Eu precisava deixar as coisas claras.
Eu queria acreditar nele. Eu amava Glen. Ele era o meu mundo. Ele dizia que eu era o dele. Éramos o mundo um do outro."
A obra trata ainda de temas sérios, como pornografia e pedofilia, de um modo muito delicado. A autora é muito sutil ao colocar algumas situações, que parecem mais uma sugestão do que uma realidade. Não há nada explícito, nada grosseiro ou aterrorizante, mas ainda assim está claro a que ponto Fiona desejava chegar. E ela não quis somente criar um caso que pudesse justificar seu livro, mas discutir todos os aspectos psicológicos envolvidos nessas situações.
A questão psicológica dos personagens, aliás, foi o ponto forte no texto. Não existem personagens monovalentes na história, todos estão em constante conflito com seus impulsos e tem decisões certas e erradas. Fiquei irritada com Jean, por exemplo, que enfrentou todas aquelas acusações junto com o marido sem nunca fazer perguntas de verdade, evitando brigas que eram absolutamente necessárias no convívio entre um casal, ainda mais considerando a situação pela qual estavam passando. Só que é fácil perceber, depois de um tempo, o quanto Jean é influenciável, insegura de tomar as próprias decisões, porque sempre foi Glen que a instruiu a fazer ou deixar de fazer alguma coisa, em todos os aspectos de sua vida. Por isso, apesar de não concordar, compreendi a personagem. O mesmo aconteceu com o detetive Sparkes, que priorizou sua carreira a ponto de quase destruí-la e ao seu casamento, e com Kate, a repórter, que fazia o que fazia para conseguir suas matérias, mesmo com alguma dor na consciência. E esses são só alguns exemplos, porque a autora vai a fundo em quase todos os personagens, mostrando lados infinitos de uma mesma pessoa.
A leitura de A viúva só não foi melhor porque eu esperava um grande final, cheio de reviravoltas e revelações surpreendentes, o que não aconteceu. Acredito que a autora tenha preferido dar ênfase às consequências psicológicas de uma situação como a que criou, mas não transformar a história em uma trama de tirar o fôlego. Não fosse a minha falsa expectativa, tenho certeza de que teria gostado muito mais da obra.